Vou a uma papelaria local
Encanto-me por um caderno
de folhas de cores sortidas
A conta ultrapassa um pouco
minhas primeiras pretensões
Em casa, entre alucinada e entretida,
escolho a caneta de rabo de sereia
e começo a transcrever poemas
Intuitivamente, todos os três são de amor.
Enquanto o bico fino de tinta azul escuro
passeia pela página corada de amarelo,
um pensamento se forma: este meu gesto
produz uma pequena ruptura no tempo.
Estou a rasgar o grosso tecido
da inestancável corrida tecnológica
quando vou, pegada à mão da minha filha,
a um lugar onde se vendem livros
Um rasgo, um pequeno furo
no contemporâneo
Uma metalinguagem
Os pássaros que ainda cantam
ainda nascem das cascas dos ovos
bicando-as
Produzem, com sua recém-força,
um furo, uma rachadura
Irrompem
colocando abaixo
toda a estrutura que antes lhes conformava.