quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Há dias procuro uma agenda velha, cheia de manuscritos, nada acontece. Entro em desespero. Tenho pressentimentos terríveis toda vez que penso em seu acabado sumiço. O que havia de mais "valioso" era a lista completa de todos os livros que li, desde a infância. Os tempos verbais me preocupam, como se a perda já fosse certa. O nome desta sensação é pássaro-negro-observa-da-janela. Apanho o caderno da lista de sensações.
Há dias prevejo a tormenta de esquecer o curso de minha história, a que se passa por trás das cortinas. É uma história segunda, mas é igualmente um grande pedaço de tempo que, arrancado, tira o norte de tudo (como se descolam rios que se encontram?). De repente, não sei se guardei quem eu sou na minha memória ou se precisava anotar em listas também. Talvez, as minhas listas guardassem a minha verdade e nunca descobri, até este momento, o verdadeiro propósito infundado de não esquecer. Perder o que sei dos meus livros é como perder o que sei de mim. Porém, penso que se esqueço boa parte dos personagens, se eles se misturam e trocam de lugar mutuamente, se eles riem de mim, devo estar desistindo da história linear da vida aos poucos. Preciso de uma linearidade, mesmo que forjada em anotações cronológicas. Quantos poemas-possibilidades morrem com o desaparecimento de um caderno esgarçado?
A pessoa que olhou aquelas páginas antigas, folheou coisas disparatadas e concluiu que nada valem, atestou, sem saber, que o curso de uma vida não vale uma folha voando no tempo.