domingo, 20 de março de 2022

Queimar todas as referências ao amor romântico

Banir dos livros, dos filmes

Criar outros livros e filmes

Queimar a monogamia

Deixá-la arder

Queimar o patriarcado

Queimar a cultura

Nenhum deus

nenhum falso amor

nenhum lar

Nada deve resplandecer no centro da clareira

Apenas você

Você

Soberana

Você

Com os pés fincados nas pedras

Contra a correnteza 


Deve crescer 

A chama que a tudo consome

Crescer

Ruir muros, levar destroços 

para, então, reflorestar 

quinta-feira, 17 de março de 2022

 O verdadeiro poder é

não ter poder em nenhuma relação

Afastar o poder

Matar o poder com as unhas

Deixar o poder sangrar

Eu não posso com você

Você não pode comigo

Poder é posse

e nós somos potência

domingo, 13 de março de 2022

Agora 

que não há nenhum homem

roubando-me espaços da alma

Sinto-me como se grávida

Suculenta de vida

a molhar toda a casa


Onde quer que me deite

deixo uma água cálida

Meus lençóis,

oceanos de leite,

À noite sou toda imersa




quarta-feira, 9 de março de 2022

Quando você decidir se erguer e caminhar de volta para si

Quando você lentamente mover o corpo e dançar seu desejo em meio à chuva

Quando você escolher retomar a vida, o ar e o amanhecer

Eles dirão louca, puta, bêbada, escória,

Como ousa?

E eu responderei

Eu sou a porra de um guepardo

Eu sou indomável


Umas mãos pesadas, masculinas,

Repousam-lhe nas pernas

A boca que roça a orelha, concluo,

é também de seu pai

Num bar qualquer, à meia-noite

Uma criança, no colo, 

talvez nove anos

Sentada, em família


Dedos grossos alisam suas coxas

Como o mais natural dos gestos

E ninguém percebe este escândalo


Amavelmente, este homem de cabelos brancos

Há poucos metros

Ensina à sua pequena

O que é o corpo da mulher no mundo

Uma propriedade para ser

Sutilmente devassada

Como bem quer o homem

Mesmo que pai

E eu, apenas eu, não evito olhar 

Por que sei, com meus olhos de fogo,

Que este homem de cabelos brancos

Tem que queimar