quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Todas as mães já falaram
das gotas que escorrem previsíveis
Nenhuma, como eu,
define
a dor de se abrir
Paraíso e
Tempestade
A terra que rachou
em mil labaredas
Para te engolir

Será que um dia a ferida se fecha?

Cada parte do teu filho
é bálsamo e unguentos
Mas a tua mãe,
a mãe da tua mãe
e a mãe do pai
são o sal derramado

A mãe chora a dor do filho
que ainda não entende ter nascido
O filho chora a dor da mãe
que perdeu sua figura no espelho

Ninguém compreende
nem há palavras
mesmo inventadas
para dizer que choramos
no meio do sorriso

Somos duas gotas
num oceano quente
Mãe é ilha de água
para seu bebê navegar

E por mais que tentem
Profanar
Esse nó
Fincado no meio
da polpa viva do seio,

esse nó de cujo ventre
nascem as galáxias
ninguém conseguirá partir.






domingo, 19 de agosto de 2018

A nuvem quando está carregada
solta raios
Sentimos o peso
das suas curvas
cheias d'água
A nuvem quer nascer
faz pequenas tempestades
redemoinhos sozinhos
vento no mar

Até a nuvem descer
demora coisa de minutos
Ela está prestes.
Esse quase
Ensina a nuvem
a não gotejar
É preciso vir inteira

Quando finalmente chega
ela chora e chora
de encontro à terra
chora tudo
refresca, afoga, floresce
até desanuviar

sexta-feira, 6 de julho de 2018

Madureza

Guardo no corpo
Um segredo místico
Uma origem
Um laço de eternidade
O princípio
Todas as palavras que conheço
Um instante consagrado
O movimento dos planetas
O rio que corre nas veias da terra

sábado, 3 de março de 2018

Li coisas que escrevi em cartas e diários e senti algo que lembra saudade. Era assim: escrever é como abrir buracos negros. Depois de um tempo irei revisitar uma época acabada apenas para reencontrar-me. A escrita é a agulha que uso para a inserção no tempo. Achei preciso.

Então pensei no que eu queria mesmo, que era criar uma vaca. Ter uma casa dentro de um sítio apenas para comportá-la. Uma vaca resgatada, a única que escapou de estar prestes a incorrer no pecado de sentir as angústias da hora da morte. Imagino-a entrando pela sala, branca, gorda, primorosa, uma exímia filha de deus. O que eu queria mesmo era ser Adélia, mas nasci Helena, consolo-me.

Pronto, outro salto temporal. Estou refletindo ser breve, dar fluxo ao pensamento. O mais importante hoje é descrever o jeito como os nossos olhos se movimentam sobre as frivolidades. Então é isso, o futuro é uma vaca descansando sua mansuetude no sofá da minha casa.