sexta-feira, 1 de maio de 2015

Pouso meus olhos doentes no mundo
(o mundo hoje é muito depois das mariposas)
e parece-me que as graças estão todas convalescentes.
Meu pai acha meu olhar com loucuras
de quem mal adentrou uma vida de verdade
Contudo, o imprescindível é não estar ajustado.

Pouso meus olhos fatigados de notícias que não o são
na imensa devastação que já se fez,
sinto nojo de caminhar entre homens
a perceber que são carne de minha carne.
Havia um deus delirioso que se deixou emprenhar
e assim viemos.

Dai aos trabalhadores os louros
por desperdiçar suas vidas
como escravos assalariados
(Uma bota pressiona vossos pescoços para sempre contra um muro, é visto!).

Aninhai as crianças famintas
que neste momento sonham
com bonecas de pão de mel.

Mas!
Parai agora tudo que esteja acontecendo.
Há um caso a mais para se destacar.

Num espetáculo de bombas de gás lacrimogêneo,
vosso frágil sonho sangra deitado no asfalto,
Uns senhores de muito poder
(tanto que não é-lhes possível enxergar as próprias mãos)
falam coisas estapafúrdias na tv,
à noite riem, de dentes escancarados,
afundando, em seguida, suas enormes cabeças
em travesseiros macios.

Volto meus olhos sem procedentes de cura
para um mundo ainda mais difícil.
Basta-me muito pouco para pensar
que, em breve, seremos apenas
um ferimento bastante suave
no dorso maculado do universo.