Uma vez, quis explicar a um homem o útero.
Eu estava ainda com o cheiro do meu sangue nas mãos, breves cólicas e a água em ponto de fervura. Pensei no útero como o segundo coração da mulher, uma sensação descendente me acompanhava por dentro, ainda que não fosse cachoeira ininterrupta, pequena queda d'água. A dor que se me desprende do útero e do coração é a mesma, e mais do que lava - pranteia, alveja e prepara. Quando você se movimenta, ela se dissipa, por isso dançamos. Por isso cobrimos o ventre com panos quentes e, como as nossas avós, não lavamos a cabeça à noite. Precisamos ficar reclusas, quietas com nosso pensamento, tomando chá.
Nosso útero pulsa e sangra e isto é tão poderoso quanto belo. Isso é um milagre.
Um dia, um homem me deu uma célula, uma única célula, e eu fiz dela uma criança viva inteira, criei-a com meu corpo, nas minhas cavernas, dando-lhe tudo de mim. Ela se alimentou da minha comida, ficou forte e sadia nadando em minhas águas. E quando chegou o seu tempo, eu rachei a minha terra em mil pedaços e pari, sozinha e com ela, o meu bebê.
Choquei meus ovos de paciência, fui mãe.
Aquele que me deu a célula deixou-me num abismo.
Segurei nas mãos das mulheres para sair.
Por que quis explicar a um homem o útero?
Agora, água fervida, chá de ervas, bolsa quente, deixo que meu sangue desça, deixo que a corola rubra se abra, encontro as minhas amigas, as minhas irmãs de alma, temos crianças crescidas, estamos em terra firme, nunca mais, nunca mais à deriva, enlaço os braços das mulheres, as crianças brincam, e nós estamos tomando chá.
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