segunda-feira, 22 de junho de 2009

Fabular


"O homem é um animal reincidente no erro, e que se nutre de metáforas"

Murilo Mendes - A Idade do Serrote



Cortarei os fios da vaidade


Para o plantio de hibiscos


Cultivar-los-ei pernoitemente


E quando florescerem


Terei todos os homens do mundo


Pois a beleza salvará o mundo


O belo, o bem


Salvarão o mundo


Os brotos de begônia cristalizados


Erguerão elefantes


E terei todos


Serei tudo


Pois a beleza salvará o mundo


Terei-lhes por debaixo


De meus cabelos de narciso


Terei todos os homens do mundo


Altivos, sedosos


Meu cesto de hibiscos


Arrastarei por sobre a terra


Pois a beleza salvará o mundo


O belo, o bem


Salvarão o mundo


Pueril ou etérea


Ou crédula e parva


Mastigarei todo verde


Enormes vezes por segundo


A seiva de minhas folhas


Prolificará urzes benfazejas


Pois a beleza salvará o mundo


O belo, o bem


Salvarão o mundo


E açoitada ou estéril ou cega


Rasgarei em meus lábios


Sorrisos encarnados


Pois a beleza salvará o mundo


Cometerei vastos poemas


Desposarei todos os amantes


Terei cansados os meus anelares


Abandonarei pegadas profundas


Repousarei em campos diáfanos


E pelas metáforas e fábulas


Salvarei todos os homens do mundo

2 comentários:

Unknown disse...

Somos mesmo uma corja de pretensiosos...sou puro orgulho desta indireta.

joao p. guedes disse...

A cada verso, nesta particularidade, singrado na amplidão da veleidade para a consumpção do sortilégio da metáfora põe em terra firme a certeza adventícia de que a salvação com que se serve o belo corresponde ao íntimo de uma reconversão da vaidade.

Gostei de seu calor vérvico. Prossigante nas opulentas emanações poéticas!