terça-feira, 23 de julho de 2013

É preciso matar o anjo da casa

Aos cinco anos de idade, eu era verdadeiramente um anjo na casa. As minhas asas atabalhoadas fizeram ir ao chão muitas bonecas de porcelana. Ainda não havia completado um ano e quebrei a vidraça de uma mesinha num só golpe de tornozelo, não me feri e minha mãe achou mesmo que estava feito milagre. Porque eu era um bebê bonito e vi muito rosto admirado, a minha mãe era risonha, maravilhada que logo ela tivesse parido um anjo loiro. Até quebranto tive, mas me rezaram. A enfermeira no hospital fez graça com meu pai, queria me levar. Ele disse que uma coisa tão bem feita não se dá a qualquer um assim. Aí, lá para os sete, eu já podia usar batom, ganhei um kit de aniversário e a casinha completa da Barbie. Depois enjoei daquele quarto todo rosa, a boa verdade é que nunca gostei, não tinha idade pra isso. Com uns dez, minha mãe me botou para lavar pratos, ponto de cruz eu achava coisa de velha, mas ela insistia. Então, entrou um senhor na nossa vendinha e me viu de agulha e pano de prato na mão, achou de fazer a ressalva: 'menina prendada!' Achei uma ofensa! Lembro que fechei muito a cara. E nunca mais cruzei um ponto na vida. Então foi mais ou menos por aí que fui deixando de ser o anjo na casa.


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