Hoje, cheguei em casa, joguei as chaves, sentei-me para afagar o cachorro. Veio minha filha, ela comia uma espiga de milho cozido. Olhei-a. Um lado de seu cabelo pendia suavemente atrás da orelha, ela estava ocupada a comer, grão por grão, distraída, tem seis anos de mundo apenas e já tanta destreza. Meus olhos encheram-se de uma emoção incontinente. E meus pensamentos voaram pela plenitude do amor por aquela criança. Toda declaração que me veio à boca parou ali e eu emudeci. Nada seria o bastante.
Tomara que ela nunca se perca de mim, que eu não me perca dela, que eu não me perca de mim tentando não me perder dela, tomara que ela nunca se perca de si.
Fui imensamente feliz naquele momento, brincando com o cachorro, uma espiga e minha filha. Apareceu, então, uma breve melancolia ao olhar para meu passado, vendo-me nela, uma menina adorável e inteligente, grande e linda. Refiz o percurso como quem perde um brinco no parque, procurei-me. Tentei saber em que ponto eu deixei de ser uma criança amada para me transformar numa mulher. Na medida em que eu deixei de ser uma sombra, meus pais ficaram para trás, sem saber como lidar comigo. Cada vez mais, e mais, até me desconhecerem, até se tornarem estranhos.
O que posso eu fazer para que minha filha nunca precise pagar este preço?
Não há garantias. Posso amá-la ferozmente e devotar toda a minha alma em seu crescimento. Não há garantias. Por isso, cada hora ao seu lado é dourada.
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