sexta-feira, 13 de março de 2009

Ao Pai: Açucena

E depois que todos os poemas desenham teu nome
Tu vens metrificar a brancura da luz da pérola
E contar os grãos do corpo
Esquentar os pães dormidos
Sufocar-me de novo

Não compreendes o limo que escorre de meu útero
Nem os copos de vinho entornados de manhã
Os copos descartáveis de vinho entornados de manhã
Os copos necessários de vinho entornados amanhã

A sangria de que não me quero alimentar
Que tu comes lambuzando os beiços
E a engoma das tuas golas das roupas
A engoma gritante das calças curtas
Clamando-me que lhes arranque as bordas feitas, alinhavadas...

Dize
Que não me devo abusar do mesmo sexo
Mundanas coisas, materiais apenas
Se, contudo, vede!
Já beijei a açucena
Favo quente que não amargo como sêmen
Pétala de leite
Que não trazes em corpo teu

Não trago
Como tragas o universo
Pois tudo que for inútil
Cabe arrastado nos meus (in)versos
Tudo que não te diz
Diz tudo em palavra minha
A efemeridade da flor cravada em minhas ancas
Que tu não foste capaz de colher
Não percebes as estações do ano
Não te comoves com as crias dos animais
Não te sabes o que é um horizonte
Não te existe o abstrato nas folhas do tempo
Nem ramos de amor
No teu vento

Atiras-me ao ridículo
Do teu miolo inconsistente
Afeiçoastes, sou alimento
Tragam-me gesso pra este pobre coração mole!

Teu nome desfez todos os poemas

Um comentário:

Zana Sampaio disse...

teu poema desfez tantos de meus minutos...muito lindo!!!