domingo, 22 de janeiro de 2017

Existe um momento
de lucidez quase obscena
na vida de uma mulher

Os pratos estão limpíssimos
e a dor que lhe atravessa
é inapelavelmente
feminina

Não há tempo para retroagir
Este momento pesa imensamente

Na madrugada de alguma cozinha
uma mulher agora pensa
que há um abismo grande demais
entre ela e o homem
que dorme

A mulher está por um fio
o homem a olha e quase não vê

O homem pensa que
precisa ajudá-la
e só pensa
A mulher percebe então que
embora os braços já estejam dormentes
precisa erguer-se sozinha

Ela ainda não sabe, mas
encontrará outras mulheres
Muito também acordadas
Neste lado de cá do abismo

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